O DESABAFO
- Cara, tô cansada de ser mulher! Na próxima encarnação, quero vir como homem.
Basta de sofrimento!Basta! – falou minha amiga.
- Pelo amor de
Deus! - exclamei. - Não fala bobagem!
- Bobagem? Tu não estás entendendo!
- Deves estar com raiva de algum
homem! O que foi que ele te fez, posso saber?
- Nada!
Ninguém me fez nada! Tô com raiva é das mulheres mesmo!
- Ah, então uma
mulher te sacaneou? - perguntei quase afirmando. E complementei como quem sabe
do que está falando: - Eu sempre te disse que as mulheres não são muito unidas.
- Burras! As mulheres
são muito burras! - sentenciou.
Apesar de ter as
mulheres em melhor conta, a prudência me impediu de discordar. Minha amiga
estava bem aborrecida e preferi perguntar por que ela chegou a esse radicalismo
quase autofágico. Ela falou durante meia hora, quase sem respirar. Discordei de
algumas coisas ditas no calor da ira. Já tinha ouvido algumas queixas
semelhantes, mas nunca fiz uma análise tão pessimista da condição atual da
mulher.
Gostaria
de ter comentado que os homens também não estão vivendo nenhum conto de fadas.
Que temos dúvidas, desconfianças, medos, e quase nenhuma esperança de
realização no amor. Que a diferença é que fomos educados para não reclamar,
tipo 'homem não chora'. Mas não deu.
- Hoje as mulheres
trabalham mais do que antigamente. Temos que ser mãe, mulher, dona-de-casa e
ainda trabalhar fora. O estresse nunca esteve tão presente em nossas vidas.
Quando nos separamos - a gente sempre se separa -, quem fica com os filhos?
Quem tem que aturar a rebeldia dos adolescentes? Quem é sempre a culpada de não
saber educar?
- Acho que tens razão
- falei - mas quem
faz questão de ficar com os filhos?
- Pois é o que eu digo!
Somos mesmo muito burras! E ainda temos que discutir na justiça se a pensão de
alimentos vai ser de um ou dois salários mínimos. Nem vai dar para a escola! E
o inglês, o clube, o curso de informática, quem paga? Quando o filho faz
dezoito anos, o pai dá um carro de presente e fica bem na foto. Eu pergunto: se
ele deu o carro, por que não paga a conta da gasolina?
- Eu... Eu compreendo - falei
timidamente.
- Na vida
profissional - ela continuou -, a mulher geralmente ganha menos. Parece que
nosso trabalho é sempre encarado como bico; que o salário vai ser gasto com
nossas coisinhas,
como os homens costumam falar. Fora as profissões em que somos discriminadas
acintosamente. E no fim de semana, quem vai pra cozinha preparar o almoço pra
todo mundo? Até a infeliz da cunhada leva o marido e os filhos para comer lá em
casa.
- Não é mole. -
comentei para demonstrar que estava atento e, ao mesmo tempo, demonstrar alguma
solidariedade.
- Enquanto isso, o quê
que o homem faz? Acorda, e o café já está na mesa. Pega o melhor carro - o
deles é sempre o melhor - e vai pro trabalho. Almoça com um cliente num
restaurante caro, usando a verba de representação da empresa; isso nós não
podemos, porque se formos almoçar com um cliente vão logo dizer que estamos dando para ele.
- Você não está
exagerando um pouquinho? - perguntei.
- E isso não é nada! -
ela continuou, ignorando minha observação. - E esses idiotas psicólogos ainda
querem discutir o tal orgasmo múltiplo. Falam sobre o assunto afirmando que a
mulher, nesse ponto, é superior ao homem. Eu pergunto: e onde está o tal
orgasmo simples? Eu já me contentaria com o “simples”. Antigamente, costumavam
dizer que poucas mulheres atingiam o orgasmo, e a culpa era da cultura social.
E hoje, que a cultura mudou? Pelas estatísticas, cinqüenta por cento das
mulheres ainda não foram apresentadas ao ‘senhor orgasmo’.
- É verdade. - tive
que admitir. - Mas ocorre que...
- Ocorre que o homem se
acha o próprio galo. Já viu como galo trepa?
Leva apenas alguns segundos.
- Sabia que ejaculação
precoce é uma doença? - perguntei, tentando minimizar a culpa masculina.
- Sabe qual é o
nome da doença? Egoísmo! E-go-ís-mo! Homem faz o bate-estaca um pouquinho e pronto: acabou a festa! A deles,
porque a nossa nem começou - nem vai começar! E ainda reclamam se estamos com
dois quilinhos a mais, ou dizem que a nossa celulite... Tô de saco cheio! E
pensar que de 'Rainhas do Lar' fomos promovidas a
'mal-comidas-sem-direito-algum'. Decadência! E saber que nós somos as
culpadas... Queria matar o cretino que inventou essa tal de igualdade entre os
sexos. Perdemos as regalias que tínhamos e as que recebemos em troca não
compensaram. Agora me diz: qual é o prazer de ser mulher?
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